segunda-feira, janeiro 27, 2014

DIA INTERNACIONAL DE MEMÓRIA DAS VÍTIMAS DO HOLOCAUSTO


Esther Mucznik é vice-presidente da Comunidade Israelita de Lisboa e Presidente da MEMOSHOÁ - Associação Memória e
 Ensino do Holocausto. Autora de vários estudos sobre o judaísmo, publicou recentemente o livro Portugueses no holocausto

MENSAGEM DIRIGIDA AO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE AMARES
POR OCASIÃO DA
SEMANA DA MEMÓRIA DAS VÍTIMAS DO HOLOCAUSTO
27 a 31 de Janeiro de 2014



Em nome da MEMOSHOÁ – Associação Memória e Ensino do Holocausto, quero em primeiro lugar felicitar o Agrupamento de Escolas de Amares na pessoa do seu Director, de todos os professores e alunos empenhados na organização desta Semana e, muito especialmente, o Professor Jorge Brandão Carvalho, pela importante iniciativa de comemorar este dia tão simbólico e pelo excelente programa previsto. Lamento sinceramente não poder estar presente, mas tenho a certeza de que será um grande sucesso.
A data de 27 de Janeiro, instituída pelas Nações Unidas, em 2005, como Dia Internacional de Memória das Vítimas do Holocausto, não surge por acaso: foi precisamente na tarde de 27 de Janeiro de 1945 que o Exército Soviético vitorioso chega a Auschwitz-Birkenau, o maior e o mais mortífero centro de extermínio do IIIº Reich. 
A escolha do campo de Auschwitz também tem uma razão: foi o primeiro campo de concentração a ser libertado pelos Aliados e o único onde a máquina de morte funcionou a todo o vapor até ao final de 1944. É com efeito, sobretudo entre Maio de Outubro desse ano, que Auschwitz-Birkenau toma as proporções que o tornam no símbolo de destruição humana, com o gaseamento logo à chegada ao campo de meio milhão de judeus húngaros, homens, mulheres e crianças.
Em novembro desse ano de 1944, sucediam-se já os bombardeamentos aliados e o Exército Vermelho estava cada vez mais perto de Auschwitz. Himmler considera então que a “questão judaica” estava resolvida e deu ordem de destruição das instalações de extermínio – câmaras de gás e fornos crematórios. Apesar de ser parcialmente verdade – a quase totalidade dos seis milhões de judeus já estavam mortos – o que também estava resolvido era a derrota da Alemanha e Himmler sabia-o. 
Por isso o objectivo nazi nesse momento é apagar ao máximo os vestígios do crime: entre Novembro 44 e até quase à chegada dos soldados soviéticos, são destruídos os crematórios, os ficheiros comprometedores, e grande parte das barracas que armazenavam os pertences roubados às vitimas à chegada ao campo. E principalmente é levada a cabo a evacuação dos detidos. Serão 58 mil prisioneiros a fazer 50 km a pé para ocidente no que ficou conhecido como as Marchas da Morte pelo facto das estradas ficarem cobertas de cadáveres, homens e mulheres vencidos pela exaustão ou abatidos a tiro. O objectivo era encaminhar os prisioneiros para os campos na Alemanha e assassiná-los como derradeiras testemunhas do mais hediondo dos crimes. Em Auschwitz, ficam apenas os doentes ou incapazes de andar e os que se escondem na expectativa da chegada dos soviéticos. 
À chegada ao campo, na tarde desse dia 27 de janeiro, os soviéticos são recebidos por cerca de sete mil prisioneiros ainda em vida, deixados para trás pelos alemães em fuga, e por centenas de cadáveres que jazem no chão. Conta o ex-prisioneiro Primo Levi, que os soldados soviéticos “não saudavam, não sorriam; pareciam oprimidos, não só pela piedade, mas por uma certa confusa discrição, que lhes selava a boca e prendia os olhos ao cenário fúnebre. Era a mesma vergonha bem nossa conhecida (…) a vergonha que os alemães não conheceram, a que o justo sente perante o pecado cometido por outrem…”
Para além dos sete mil prisioneiros e dos cadáveres encontrados, os soldados soviéticos depararam-se com perto de dois milhões de peças de vestuário e sapatos de homem, mulher e criança e, na fábrica de curtumes, com sete toneladas de cabelos de mulher – nos seis armazéns de roupa e bens que os alemães não tiveram tempo de destruir. São até hoje testemunhos mudos, mas eloquentes de um crime sem nome.
Em Auschwitz-Birkenau foram assassinados 1,1 milhão de judeus, 70 a 75 mil polacos, 15 mil prisioneiros de guerra soviéticos, 21 mil ciganos e cerca de 10 mil prisioneiros de origem diversa. Mas estes números, relativos apenas ao complexo de Auschwitz-Birkenau, estão longe de contar o imenso sofrimento de seres humanos que, antes da morte com o gás, a tiro ou na mesa de diabólicas experiencias, foram despojados de tudo aquilo que fazia a sua humanidade: família, pátria, língua, nome, integridade física e psicológica…
Hoje lembramos tudo isto, neste Dia da Memória. Não apenas para homenagear a memória das vítimas e lembrar o seu sofrimento, mas para através do conhecimento do que aconteceu, conseguirmos detectar nos conflitos actuais e futuros os sinais que levam à tragédia. Porque por muito que proclamemos “Nunca Mais”, aconteceu uma vez, pode pois tornar a acontecer. 
Por isso, são de saudar todas as “co-memorações” levadas a cabo nestes dias e que despertam para a necessidade de saber e de conhecer. Muito em particular saúdo a vossa importante iniciativa certa de que ela contribuirá para a vossa formação como seres humanos. É objectivo da Memoshoá – Associação para a Memória e o Ensino do Holocausto, em cujo nome vos dirijo esta mensagem, incentivar o conhecimento entre professores e alunos do Holocausto e apoiar esse trabalho de todas as formas ao nosso alcance.
Termino desejando-vos a todos um grande sucesso nesta semana da memória. 

Que ela nunca se apague!

27 de Janeiro de 2014

Esther Mucznik
Presidente
MEMOSHOÁ

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